sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Da Boca pra fora - O Samba Paulistano é marginal e vive na Boca do Lixo!

Marcus Marmello Texto


“O terceiro mundo vai explodir... quem tiver de sapato não sobra” – Rogerio Sganzela em “O Bandido da Luz Vermelha”.

Dizer que a Boca do Lixo, hoje só é referência de prostituição e comércio de eletrônicos é uma grande estupidez, fruto da ignorância a que o mundo está fadado, existe alguns que acreditam que Jornalismo se faz com um bom texto e atrás de um computador. Infelizmente o mundo virtual vicia o Jornalista ao mundo encantado da preguiça. Isso não é regra... Ok?

Senão vou receber um Kg de e-mail s de gente dodoizinha.

A Boca do lixo na década de 70 foi o pólo de cinema de São Paulo, arrebatado pela influência do cinema novo, “Uma câmera na mão e uma idéia na cabeça” de Glauber, surge o primeiro movimento “Punk-cinema” talvez do mundo. O cinema marginal paulistano.

Há muito mais história cultural entre as avenidas Rio Branco e Duque de Caxias no centro de São Paulo, do que pode supor qualquer filosofia. Aproximadamente 700 filmes foram produzidos na região da Boca do Lixo, nome concebido pela crônica policial da década de 70 devido a prostituição e “bate-carteiras”. Vamos dizer assim que era uma versão mais turbinada da Lapa carioca, que na década de 70 já não tinha tanta importância para a juventude “socialista e revolucionária” do pós cinema novo. Só que a Lapa não é mais marginal, a Boca sim.

Isto me fez pirar na década de 80. Filmes como Copacabana Mon Amour, Bandido da Luz Vermelha, e vários outros, se eu ficar citando aqui nome de filme eu fujo do foco. Vamos lá...

O caráter cultural do lugar nunca morreu, mesmo quando na década de 90, os caras que escrevem colunas policiais, começaram a chamar o local de “Crackolandia”. Como uma forma de marginalizar ainda mais o local, mas por incrível que pareça existe e sempre existiu uma coisa lá que pouca gente fala, cultura.

A Boca do lixo sempre foi pólo de cultura na cidade de São Paulo, tanto que hoje a Secretaria de Cultura fica ali na região da Luz.

O Problema é que São Paulo, como sempre, veste-se de consumidor de cultura e não como fomentador. O que deveria ser política de Estado vira obrigação e motivo de marginalização.

E é nesse cantinho da Boca do Lixo, precisamente na Rua General Osório que todo sábado e principalmente no último sábado do mês, que a cultura do samba, se veste de São Paulo.

Diferentemente da Vila Madalena e de Pinheiros que celebram um samba mais embrulhado com laços de fita cor de rosa, para um público de meninos e meninas encantados com o samba e que pagam (o que é bom). A Boca do Lixo celebra o samba de Raiz por gente que é de Raiz. A Boca é o reduto, é de onde nasce o samba de São Paulo e onde os sambistas do Rio têm como referência em São Paulo.

Ouvia sempre dos coroas de onde cresci (no bairro de Irajá – Rio de Janeiro) que no samba o mais importante era saber chegar pra poder sair.
Que num resumo poderia ser: Saber chegar, respeitar quem já está lá, mostrar o seu próprio valor, conquistar o seu espaço, e ainda o mais difícil, sem perder a humildade,e sair sabendo do respeito que conquistou. Isso é difícil?
Respondo a você... É.

A amizade, o respeito e principalmente a ética são fatores primordiais para um sambista. E nisto exclui-se os bairrismos babacas. Pois é através da ética que se estabelecem relacionamentos de convivência entre profissionais afins.
Uau...falei bonito, me senti doutor.
E como bom carioca paulistano que sou a cada dia que passa mais entendo o porquê da região da Santa Ifigênia ser de vital importância para a cultura paulistana e brasileira.

“Incrível Fantástico extraordinário
Crime na cidade na boca do lixo
Cadê o bicho, cadê o bicho, cadê o bicho, cadê o bicho”.

Jovelina Pérola Negra

Música: Boca do Lixo

( Reco Primavera - Mário Gogó - Marquinho Pagodeiro)

Que o samba sempre viveu à margem, isto é, que o samba é marginal... Isso é fato. Basta ver a quantidade de rádios em São Paulo ou no Rio que realmente tocam samba. E o fomento e o respeito que o samba recebe fora do período do carnaval?
“Alô Alô Presidente Adamastor
Samba não é só de enredo
meu filho! “

E dizer que a maioria dos sambistas brasileiros um dia esteve na Boca do Lixo, é a mais pura verdade. Nesta mesma década de 70, era comum você encontrar Almir Guineto, Zeca Pagodinho, Originais do Samba, Jamelão, Paulinho e muitos outros, freqüentarem e até morarem temporariamente na Boca.

Até hoje em dia a Boca é um local onde todo mundo se encontra, compositores, músicos, interpretes, de todo o mundo do samba e do choro.
Nada mais à margem do que o choro.

Pedi ao Céu um remédio que possa curar... (Luverci Ernesto e Almir Guineto )
Alí na Boca que conheci Luverci Ernesto, parceiro de muitos sambas com Almir Guineto, Dedé Paraíso, e pasmem, o cara foi parceiro de Baden Powell. Teve musicas gravadas pelo Zeca, Alcione, Beth, Quinteto, e outros. Teve uma vez que ele me deu um CD com aproximadamente 60 musicas dele gravadas ainda na época do vinil por gente que hoje é grande, mas que na época estavam ali... De bobeira?
Se a gente passear pela MPB encontramos Caetano Veloso que imortalizou a região com Sampa. E principalmente por Paulo Vanzolini com Ronda.

Se eu for falar de todo mundo de samba que já esteve na Boca do Lixo o meu tempo não dá, não dá.
O Luverci, o mestre Luva, me fez ver, entender e respeitar o local.

Quem aparece...não desaparece, só morrendo.

Apesar de o local ser freqüentado por todo mundo, que baixa lá no último sábado do mês para o famosa “Rua do Samba”, evento patrocinado pelo governo do estado, durante os outros sábados a porta da loja Contemporânea na General Osório, serve como local de encontro de todo lugar do Brasil. Almir Guineto, Mazinho do Salgueiro, Esguleba, D. Inah, Wilson Moreira, Paulão, Murilão, Izaias do Bandolim, Ayrton Santa Maria, Oswaldinho da Cuíca, , Tobias da Vai Vai, , Bandeira Brasil, e de outros sempre que podem estão ali...por que será, né?

Um lugar, que acreditem o mundo inteiro freqüenta, é muito comum ver turistas na roda de choro da Contemporânea. Roda que existe graças ao Seu Miguel (que tem o título de imortal do samba)

O local serve de referência tanto para rever os amigos, para adquirir um novo instrumento, trocar informações, divulgar trabalhos, ouvir o chorinho, e aí o bicho pega. Chorão é o que não falta.
E depois de ver essa galera, esticar no boteco em frente onde o “Centro do Samba” faz uma roda de respeito, sob o comando de outro compositor e amigo, Beto Velasco. Aproveito para mandar um abraço ao Jamil, Tadeu, Ronaldo, Dodô e Cristiano, o velho Mamute. Que sempre me tratam com respeito, e que compartilham o velho telecoteco do meu tamborim.

E nestas idas e vindas, tive o prazer de conhecer um pouco da história do lugar desde que a Contemporânea era uma lojinha, onde seu Miguel fazia instrumentos de percussão e de onde nasceram sambas maravilhosos.
Se estivéssemos passeando pela Boca do Lixo, no início da década de 70, poderíamos ver além de Julio Bressane, Rogerio Sganzela, Zé do Caixão e Índio, veríamos também muita gente do samba.

Então antes de falarem que o samba está na Vila Madalena, acredito que os paulistanos e os brasileiros que gostam de samba, deveriam conferir de onde ele vem e onde ele nasce em São Paulo...
Este é o samba da Boca do Lixo.
Valeu... Fui.

Marcus Marmello
Sambista,Carioca, Paulistano e Compositor
contato@marcusmarmello.com

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Cavaquinho é com ele: Alceu Maia


Conhecido como um dos grandes ícones do Cavaquinho, Alceu Maia, participa do projeto Zanzei e vem mostrar para os amantes do instrumento um pouco da sua história, e suas opiniões sobre o cavaquinho.


"Em primeiro lugar, divulguem este projeto que é mais uma forma de divulgar a nossa música e quem trabalha com amor em prol da nossa cultura verdadeira. A mensagem que deixo é que abracemos a música (fazendo ou simplesmente curtindo) como forma de nos aproximarmos das coisas boas da vida."(Alceu Maia sobre o Zanzei)

Confira o bate papo.


1. Zanzei: Como surgiu o interesse pelo cavaquinho?

Alceu Maia: Eu comecei tocando violão. Meu irmão tinha uns amigos que estudavam e se reuniam para tocar. Eu ficava apreciando e, quando eles terminavam, eu pegava o instrumento e tentava tocar alguma coisa. Durante algum tempo participei de festivais de música em vários colégios aqui do Rio, sempre tocando violão. Em um destes festivais um dos participantes tocava cavaquinho e aquele “violãozinho” me chamou a atenção. Pedi para dar uma olhada e fiquei bastante interessado. Daí pra frente o interesse foi aumentando. Eu era amador ainda e tocava em várias festas de amigos. Como tinha um parceiro que tocava violão, passei a tocar cavaquinho nestas reuniões.

2. Zanzei: As gravações tiveram um papel decisivo na sua carreira?

Alceu Maia: Sim, fundamental. Com elas eu tive o privilégio de conviver e aprender com grandes nomes da música e me tornar amigo de muitos deles.3.

Zanzei: Gravando e acompanhando diversos cantores do Brasil e de fora. Quais os que você mais se emocionou por estar podendo acompanhar com o seu cavaco?

Alceu Maia: Cada gravação é uma emoção diferente. Já gravei com muitos e muitos artistas daqui e de outros países. Independente da qualidade da música, alguns cantores nos emocionam mais não só por causa de seu talento, mas, também, por uma questão de afinidade. Nessas inúmeras gravações a gente acaba fazendo muitos amigos e aprendendo a admirar as pessoas além do âmbito musical.

4. Zanzei: Quando começou a tocar cavaco e quais foram suas influências?

Alceu Maia: Comecei por volta dos dezessete anos, mais ou menos, nas tais festinhas das quais lhe falei antes. Quanto às influências, foram várias. Uma delas, claro, é Waldir Azevedo, pelo seu estilo, sentimento ao interpretar as músicas e como compositor. Outra referência é o Mané do Cavaco. Ele é um músico super intuitivo, mestre em solos e acompanhamentos, além de compositor de primeira.

5. Zanzei: Você tem bastante experiência no palco e no estúdio. Como o cavaco se comporta nessas situações?

Alceu Maia: Eu considero o cavaquinho como o meio campo de um time de futebol. Ele faz a ligação entre a harmonia e a percussão. Em determinados tipos de música tem que ser mais comportado, em outros, mais atrevido. Há que se ter discernimento para avaliar cada situação e atuar em cada canção de maneira adequada.

6. Zanzei: O que é mais importante para quem está começando a tocar cavaquinho?

Alceu Maia: Em primeiro lugar, você tem que gostar do instrumento de verdade. Dedicação é fundamental, portanto, esteja sempre com ele, estudando, curtindo, tocando, pesquisando. Estudar música paralelamente vai ajudar muito, mas sempre é bom praticar tirar músicas de ouvido para aguçar a percepção musical.

7. Zanzei: Como você vê a evolução do cavaco? Como instrumento e como modo de tocar.

Alceu Maia: Quanto à construção dos instrumentos, creio que mudou desde a sua forma, ao estilo e à sofisticação. Antigamente alguns eram trabalhados em madrepérola com finalidade estética e outros menos "enfeitados". Hoje as fábricas e os luthieres preocupam-se menos com a parte estética, até por uma questão de preço. Os cavaquinhos mais sofisticados atualmente, os "top de linha" são feitos com ênfase no acabamento e pensando mais na sonoridade do que na aparência. Estou falando dos "top de linha".
Existem instrumentos visando estudantes e iniciantes, com madeiras menos nobres e acabamento menos caprichado. É tal como a oferta de outros produtos, como, por exemplo, automóveis: existem os modelos populares e os luxuosos. A Giannini estará lançando na feira da música, no final deste mês, um cavaquinho da série Signature, assinado por mim, com a preocupação de atender
ao que os músicos cavaquinhistas procuram: ele prima pela afinação e pela sonoridade, bem equilibrada entre graves, médios e agudos. Quanto à forma de se tocar o instrumento eu diria que não aconteceram muitas mudanças. Estilos de acompanhamento como o do famoso Canhoto estão por aí até hoje. A maneira de Waldir Azevedo solar é exemplo paratodos. O cavaquinho tem sido usado em gêneros musicais mais recentes (como a música da bahia, os chamados pagodes modernos etc) e, por isso, tocado de um jeito diferente. Eu mesmo já gravei rocks, baladas, blues etc, com meu cavaquinho.


8. Zanzei: O choro é um estilo muito importante para a formação musical. Como você vê este estilo hoje?

Alceu Maia: Eu venho de uma época em que o choro estava esquecido pelos jovens. Formei um grupo chamado “A fina flor do samba” que acompanhava a Beth Carvalho e tocava choro de uma forma moderna (moderna para a época e até para hoje em dia). A formação era: bateria, baixo acústico, cavaquinho, violão de seis, flauta, pandeiro e surdo. Era bem diferente dos regionais tradicionais, mas com alma brasileira de choro. Esta formação nos permitia algumas liberdades em termos de arranjos e interpretações. O choro hoje já não é aquela coisa antiga e preconceituosa, é livre como o jazz. Hoje, além do repertório tradicional, a gente ouve muitas novidades nas rodas e em shows e há muitos conjuntos de choro formados por jovens. Isto é a certeza de que o gênero se fortalece a cada dia.

9 .Zanzei: Você é considerado um dos melhores cavaquinhistas de toda a história. Como você se sente com todo esse reconhecimento?

Alceu Maia: Acho que são vários e vários e me sinto orgulhoso de ser considerado um deles. Acho muito gratificante receber comentários de que fui e sou referência para jovens instrumentistas e de ter participado, mesmo que indiretamente, da formação destes músicos.

10. Zanzei: Como você está vendo o mundo do samba atualmente?

Alceu Maia: O samba é uma união de vários estilos. É uma nação com seus estados e cidades: sambas de enredo, partido alto, sambalanço, samba de raiz, o pagode tradicional, o pagode moderno (sem preconceito, por favor...) entre tantos outros. Artistas como João Nogueira, Clara Nunes, Roberto Ribeiro são reverenciados e homenageados pelos novos talentos que vão surgindo. A Lapa, por exemplo, oferece muitas opções de shows com os novatos e com os grandes mestres de sempre. Grandes nomes, como Zeca Pagodinho, Beth Carvalho, Martinho etc, continuam firmes e fortes. A força do samba fica clara quando nomes de outras vertentes musicais se rendem e ele e prestam
homenagens, como nos casos de Marcelo D2 e Maria Rita, por exemplo. Hoje em dia podemos ousar discordar quando se canta “samba, agoniza, mas não morre”.



Jogo Rápido

Livro: Violetas na janela (mais recente)
Cd: Waldir Azevedo e Jacob do Bandolim (relançamento)
Filme: Ray (Ray Charles)
Instrumento: além do cavaquinho, violão.
Cantora: Ana Costa
Cantor: Roberto Ribeiro
Cidade: São Pedro d’aldeia
Time: Flamengo
Viagem: pelos caminhos do som...
Sonho: o fim da pirataria

Equipamento
Cavaquinhos: Do Souto, Tavares e, agora, Giannini, série Signature, Alceu Maia. É um instrumento que desenvolvemos em conjunto por cerca de dois anos e tem a sonoridade procurada pelos músicos, que é um som mais grave, encorpado. Além disso, a afinação é perfeita.
Palheta: Fender, D’ Andréa e Giannini médias.
Cordas: Cobra, da Giannini.
Afinador: Uso vários: Intelitouch e Giannini (que são fixados através de pressão) e um TU-12H, da Boss.
Captador: no Giannini uso um Biband (excelente!); nos outros Barkus Berry e Shadow e SD, todos de contato.


______ZANZEI__________